Data: 20 de Outubro de 2022 – por Marcelo Paciolo, Head de Supply Chain da AGR Consultores
Não é novidade para ninguém que hoje vivemos em um mundo globalizado. Todos nós estamos conectados com o mundo por meio de economia, cultura, política, questões sociais, entre muitas outras. Principalmente no cenário econômico, a globalização desempenhou e ainda desempenha um papel crucial no desenvolvimento dos países. A conectividade a nível mundial baixou custos na cadeia de produção e simultaneamente reduziu os tempos de circulação de produtos em torno de todo o planeta.
A globalização também abriu uma oportunidade para países em desenvolvimento. Isso porque muitas empresas de países desenvolvidos que se instalam nesses territórios, aumentam o grau de industrialização, diversificando a economia local e cooperando com o desenvolvimento humano, gerados através do aumento do nível de emprego e tecnologias vindas de fora.
No entanto, no movimento de globalização realizado nesse século, notamos que parques industriais inteiros foram movimentados de um país para outro país estrangeiro. Vamos pegar por exemplo a China. Em função dos custos, muitos países “terceirizaram” sua produção no Oriente, gerando perda de muitos empregos dentro do seu próprio país.
Alguns países já vinham notando que essa estratégia poderia colocar em risco o abastecimento da cadeia de suprimentos local. Recentemente, passamos por uma das maiores crises humanitárias que a globalização já enfrentou – a pandemia por Covid. Nesse cenário, ficou evidente a fragilidade que a estratégia apresenta. Tivemos uma ruptura generalizada na cadeia de suprimentos, faltaram insumos para basicamente toda a cadeia de bens de consumo.
Imediatamente após a pandemia por Covid, iniciamos uma outra tensão, dessa vez geopolítica, proveniente do conflito entre Rússia e Ucrânia. Por causa da guerra entre os dois países, toda a economia foi extremamente afetada com o aumento dos preços de alimentos, petróleo e gás.
Todos esses eventos estão levando os países a repensarem esse grau de dependência de mercados externos. A maior evidência disso é que a proporção média entre exportações em relação ao PIB vem se mostrando em estagnação ou diminuição desde a crise financeira de 2008. Esse movimento é o que chamamos de Desglobalização.
Além do aspecto econômico, outro fator que tem contribuído para Desglobalização é o aspecto político. Em várias nações temos visto o crescimento exacerbado do “nacionalismo” com respectiva ascensão de medidas populistas. Nos EUA, esse cenário foi batizado com o slogan “America First”, mas também vimos outros movimentos como o Brexit na Inglaterra e a campanha “autoconfiante” da Índia.
Todos esses aspectos somados estão transformando todo o conceito atual da cadeia de suprimentos. Com a aversão ao risco de novas rupturas no abastecimento somando a políticas protecionistas, muitos países estão regionalizando suas cadeias produtivas localmente, reduzindo a dependência externa em relação a insumos e tecnologia. Obviamente essa migração (e porque não dizer descentralização) do parque industrial para todas as regiões do globo irá gerar a obrigatoriedade de revisão do plano estratégico e operacional de muitas empresas. É evidente que quem não acompanhar esse movimento ao longo dos próximos anos, poderá perder muitas oportunidades de novas fronteiras de negócios, além de ver cada vez mais seu mercado perder competitividade ou atuação frente a um potencial consumidor.
Analisando pela ótica da nossa realidade, ou seja, no Brasil, alguns especialistas afirmam que podemos sofrer menos ou até mesmo tirar proveito da situação. Inicialmente sofrer menos, pois a representatividade do Brasil no comércio global é baixa, em torno de 1,2%. Por já ser baixa, significa que estamos menos expostos ao risco dessa desregionalização.
Sobre melhor aproveitar, temos vários pontos favoráveis. Primeiramente, o processo de regionalizar no Brasil pode gerar um aumento de exportação, além das commodities. Nós temos uma posição geográfica privilegiada capaz de atingir os mercados americano e europeu de maneira eficiente. Além disso, nossa matriz energética é majoritariamente limpa, o que atrai a atenção de investidores que cada vez mais buscam investir em locais que estejam aderentes com o desenvolvimento do meio ambiente. Outro fator muito importante é o enfraquecimento do real frente a outras moedas como euro e dólar, que deixou a nossa mão de obra e nosso custo de produção mais barato e consequentemente mais competitivo.
Tanto a globalização quanto o antagonismo da desglobalização apresentam vantagens e desvantagens. A tendência é estarem cada vez mais em equilíbrio, de maneira a garantir menor dependência de pautas estratégicas (energia, alimentos, tecnologia) de outros países e estarem melhor preparados diante de novos eventos que possam gerar ruptura global. O maior desafio é entender com qual velocidade esse movimento de desglobalização ocorrerá e qual será sua proporção frente à globalização para adequar os negócios e vislumbrar oportunidades de gerar receita.